segunda-feira, 20 de setembro de 2010

VIOLÊNCIA E EDUCAÇÃO: breves notas

* MARQUES, Rafael Rodrigues Lourenço

O tema violência é vasto, amedrontador e cheio de significados socialmente construídos. A história humana é permeada pelos fenômenos da violência e cada época e grupo social imprime um significado específico a este assunto. Mais do que isso, para além desta idéia coletiva acerca da violência, cada indivíduo também faz sua reflexão, a partir de seu crivo subjetivo. É portanto um objeto multi-facetado, que merece estudos a partir dos mais diversos olhares.

Uma importante perspectiva a ser assinalada é a do significado socialmente partilhado, o senso comum acerca da violência. Matta (1982) fala a maioria dos estudos feitos sobre o tema, mostram um olhar objetivo que evoca questões físicas, como agressões, brigas e confrontos, sempre em uma relação de desequilíbrio entre força e fraqueza.

Para o senso comum, a violência é mais ação do que processo. De acordo com Marques, Siqueira e Speller (2006), este pensamento que exclui o processo e retifica a ação é encontrado em muitas notícias veiculadas pela imprensa. Trata-se de um círculo de reprodução a ser rompido.

Esta dinâmica pode ser quebrada com diálogo e o exercício democrático, tomados como ações reflexivas. Na filosofia encontramos em Arendt (2001) a relação entre democracia e violência. As relações de poder na esfera pública, condicionadas ao conceito de autoridade que segundo a autora só existe mediante consentimento e apoio dos cidadãos da polis. A autoridade de “um” só pode existir se autorizada pela maioria.

Arendt (2001) afirma ainda que poder e violência são opostos, pois onde um domina absolutamente, o outro está ausente  e que a violência opera de forma recorrente onde o poder se desintegrou. Isto explica o fato de que as sociedades onde a democracia é limitada são lugares onde a violência impera como lei vigente.

Um aspecto da violência é encontrado em Costa (2002) quando este afirma que ela - a violência - é uma propriedade da cultura, ou melhor, um motor-propulsor da reprodução cultural, um dos mal-estares de nossa civilização, segundo a psicanálise.

No parágrafo acima, podemos perceber a relação entre violência e a teia social, circunscrita pela perspectiva da psicanálise. Paoli (1982) nos fala da contribuição dos saberes da psicanálise na relação entre social e indivíduo, mais precisamente da questão de um inconsciente ativo na determinação de condutas e na definição de identidade. Indivíduo desejante e sociedade se constroem mutuamente. Deste caldo, surge a cultura.

Podemos encontrar uma definição ampla de cultura em Guareschi (1982, p.122)
Um conjunto de sentidos e significações, de valores e padrões, incorporados e subjacentes aos fenômenos perceptíveis de ação e comunicação de um grupo humano concreto. Este conjunto é vivido pelo grupo e por ele assumido como expressão própria de sua realidade humano-social. É um conjunto que passa de geração para geração, conservando o que foi recebido, ou transformado, efetiva ou pretensamente, pelo próprio grupo
Uma definição mais alegórica de cultura que pode contribuir para uma reflexão acerca da questão discursiva é a encontrada em Calligaris (1997, p. 194),
[...] é fundamentalmente um fluxo discursivo, quer dizer tudo o que foi se articulando discursivamente, oralmente ou por escrito, no quadro desta cultura. (...) uma espécie de rio de palavras que vai andando e, no meio deste rio, a gente fala e pede carona. De repente, o que a gente diz só encontra significação no que vai ser dito ou no que foi dito antes. Uma cultura é isto, um enorme fluxo de produção discursiva.”
Dadas as relações entre violência e cultura, podemos refletir acerca do campo educacional. Assim como a violência, a educação possui um leque amplo de estudos e interpretações. Para delimitar e ao mesmo alinhavar os temas aqui discutidos, usaremos a definição de Kupfer (2000, p. 42). Para a autora é na escola que a criança (ou o jovem) aprende a fazer o laço social e é imersa na cultura. 
[...] o discurso da educação é justamente o que constitui e justifica o laço social, (...). Desta perspectiva, educar torna-se a prática social discursiva responsável pela imersão da criança na linguagem, tornando-a capaz por sua vez de produzir discurso, ou seja, de dirigir-se ao outro fazendo com isso laço social.          
A educação é aqui conceituada, portanto, como um discurso social que transmite a demanda social regulada pela cultura. Além disso, a educação contribui para a geração e a conservação da cultura, bem como também para a interação de culturas (IJUIN, 2005).

É portanto uma espécie de berço social, sendo permeada por discursos e relações de poderes. Um desequilíbrio entre poderes presentes no lócus escolar pode colaborar para a proliferação e massificação dos fenômenos da violência em nossa sociedade.

Violência na escola: banalização?
Para entender a sociedade, basta perceber o cotidiano da instituição escolar. Os fenômenos de exclusão social presentes em nosso país, bem como a crise educacional, citada na introdução deste trabalho, podem ser identificados na escola. Lá, a violência surge na forma de drogas, crimes e quebra de autoridade. (GUIMARÃES; DE PAULA, 1992).

Este é o contexto onde o professor, um dos protagonistas da cena escolar se insere. A identidade do professor vive um conflito tencionado. Por um lado a importância de sua função como reflexo e ponta de lança da sociedade do trabalho e por outro pela desvalorização de sua prática, seja pela má remuneração ou pela falta de condições de trabalho.

Está preso entre a figura do herói engajado e a de excluído emudecido. Entre discursos queixosos e falas idealistas. Por serem muitas vezes contraditórias, as palavras e ações do professor compreendem um vasto campo de significados a serem pesquisados e teorizados.

* Este trabalho é trecho de um futuro artigo. Ainda estou trabalhando nele... =)

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